A obra clássica de Vítor Nunes Leal, Coronelismo, Enxada e Voto, descreve a realidade da sociedade e do Estado brasileiro durante a primeira república entre 1889-1930.

O desenho institucional daquela república era  o sistema político coronelista caracterizado pela sobreposição de um desenho institucional moderno sobreposto à uma estrutura social arcaica.

No coronelismo, como sistema política nacional havia uma dependência estrutural do poder local ao poder imediatamente superior, através do quadrilátero de dominação: Colono-fazendeiro. Fazendeiro-prefeito. Governador-prefeito. Presidente-governador. Ao  presidente interessava o voto unânime do congresso, e em contrapartida o governador ganhava a autonomia informal do estado sob a forma de carta branca para exercer o arbítrio total nas relações de poder na esfera estadual e municipal.

O resultado desde desenho institucional informal foi a enorme fragmentação do poder em direção do governo do estado, que passou a ter o controle sobre o prefeito municipal através do controle orçamentário. Segundo Leal, é a falta autonomia financeira que deixa o chefe do executivo local totalmente  dependente  do governador. Eis a origem do governismo municipal.

Com a revolução de 1930 e o Estado Novo de 1937 centralizou-se o Estado brasileiro do ponto de vista orçamentário, administrativo e político. Com a redemocratização de 1945 e 1985, o Estado Nacional volta a ter um desenho federativo, porém, até hoje estados e municípios continuam dependentes orçamentariamente do governo federal.

Este desenho orçamentário, ao concentrar 70% dos recursos nas mãos da União federal faz com que governadores e prefeitos dependam, enormemente,  de recursos federais. A constituição de 1988 concedeu maiores atribuições aos municípios sem contrapartida orçamentária.

Não é de estranhar, que este desenho federativo, quase unionista, crie uma dependência estrutural dos municípios em relação aos governos estaduais e federal, gerando o  pragmatismo de prefeitos, mais conhecido como governismo, que sintetiza a opção acrítica da grande maioria de prefeitos aos governos de plantão, no plano estadual. É só relembrarmos que os mesmos partidos e prefeitos que faziam parte da “União pelo Pará” de Almir Gabriel vieram a aderir ao governo estadual de Ana Júlia do PT.

Este é um fenômeno que se repete em todos os estados da federação brasileira. Na verdade a dependência orçamentária das prefeituras  ao gerar este famigerado governismo acaba por criar condições para que surjam nos estados a figura do governador como verdadeiro barão da federação, que termina por controlar informalmente a justiça, o legislativo e os prefeitos municipais.

Esta constatação chama a atenção para a necessidade de uma reforma tributária em direção a estados e municípios e que tenha como consequência uma repactuação de nosso pacto federativo, que hoje está falido.  Este é um sonho, seguramente, secular e de difícil materialização, até porque o sul e o sudeste controlam este país, econômica e politicamente e não quererão abrir mão deste privilégio histórico, para a desgraça do Brasil do norte, nordeste e centro-oeste.

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