Ao contrário de marxistas e anarquistas, creio que o Estado e seu aparelho burocrático e militar foi a principal invenção da humanidade para vir conseguindo, satisfatoriamente, perenizar a humanidade no planeta Terra. O Estado ao nascer, em torno de 6 mil anos atrás, tinha somente a função de proteger as fronteiras, garantir a ordem interna e administrar uma justiça, na relação entre os habitantes e resguardar os interesses da dinastia dominante.
Com o advento das revoluções liberais dos séculos XVII e XVIII, no UK, EUA e França, o Estado é minimamente manietado em seu poder de dominação social, advindo a primeira geração de direitos, o direito civil ou negativo, onde o Estado não poderia intervir nas relações econômicas, na propriedade privada e teria a obrigação de proteger os cidadãos do arbítrio do governante. Enfim, o Estado no ocidente começou a ser civilizado.
O final do século XIX, assistiu a luta operária na Europa e nos EUA pelo sufrágio universal, advindo até os meados do século XX, os Direitos Políticos a serem garantidos por normas constitucionais. A partir do primeiro quinto do século XX e até após a segunda guerra mundial, a classe operária, dirigindo governos nacionais mudou o perfil dos Estados nacionais na Europa e assim, os Direitos Sociais foram inscritos nas constituições e, criou-se os Well Fare State, O Estado de Bem Estar Social.
Países da periferia do capitalismo, como América Latina, África ou Ásia, jamais conheceriam o significado prático do Estado de Bem Estar Social, nem no seu conteúdo e nem em sua forma. Ainda hoje, mesmo depois dos ataques de governos liberalistas dos anos de 1980, os serviços fundamentais do Estado Social, nos Países baixos da Europa foram mantidos.
Países como Suécia, Noruega e Finlândia continuam ser modelos de serviços públicos na educação, saúde, transporte público e distribuição de renda. Mesmo no chamado centro do capitalismo europeu, como na Inglaterra, França e Alemanha, os serviços públicos ainda são relatados como de alto nível.
Na América Latina e particularmente no Brasil, houve muitos avanços no que tange ao financiamento dos serviços públicos de saúde e educação. Diferentemente de outros tempos, a constituição de 1988 melhorou e muito, se compararmos com as fases anteriores, o financiamento para saúde e educação. O Brasil incorporou a população em massa aos serviços de saúde e educação, porém, estes serviços continuam de baixa qualidade.
Não somente os serviços de saúde e educação são de baixa qualidade, os serviços de uma maneira geral são ruins. Os serviços de transportes públicos, os serviços que deveriam cuidar do dia a dia das cidades, o atendimento rotineiro nas delegacias de polícias, o atendimento nos órgãos públicos, dos terceirizados, ou seja, geridos pelo setor privado, como luz e telefonia, são deprimentes.
Podemos afirmar sem margem de dúvida: todos os serviços públicos no Brasil, principalmente aqueles que acontecem no espaço municipal funcionam muito precariamente. Hoje temos recursos, temos pessoal, mas o cidadão se sente humilhado todas as vezes que procura os serviços públicos, seja de saúde, luz, telefone, serviços burocráticos de polícia, enfim tudo vai muito mal. Serviços de segurança preventiva e coercitiva, nem se fale.
E ainda tem gente que diz que a reforma política é a mãe de todas as reformas. Não, o sistema político brasileiro vem sendo funcional quando demandado. Os governos vêm governando, o sistema político produz maiorias necessárias à governabilidade. O que vai mal e, esta sim, é mãe de todas as reformas, é a reforma na gestão dos serviços públicos. A questão central é: como fazer funcionar em favor do cidadão os serviços públicos neste País, principalmente no espaço municipal, que é onde vivemos?
Não adianta discurso sociologês, economês ou politiquês, a ordem é: reforma na gestão do Estado Já, especialmente no espaço municipal. A dimensão federal e estadual significa, territórios fictícios. O cidadão não mora no espaço federal ou estadual, o cidadão vive no município.
Mas, esta que seria a agenda central da sociedade, não é percebida nem pela classe política e nem pela mídia, seja ela tradicional ou virtual, sejam os grandes jornais, sejam os blogs. Enquanto isso, assistimos o povo revoltado contra o aumento de ônibus, como em junho de 2013, ninguém percebeu o conteúdo daquele movimento. Aquele movimentou significou a ponta do iceberg dos problemas centrais enfrentados pela cidadania. Aquele povo procurava culpados e, muitos culpam a corrupção. Corruptos existem , existirão e devem ser punidos....mas a culpa destes desserviços é da incompetência gerencial do Estado, especialmente na dimensão municipal.
Este grito da sociedade é tão invisível pelos governantes e líderes da sociedade civil, que uns acham que a reforma política é a questão central, outros acham que é a reforma tributária, e outros acham que a proposta principal é privatizar tudo. Mas hoje, no Brasil, a gestão é ineficaz e ineficiente, tanto por parte dos servidores públicos, como por parte daqueles que gerem concessões públicas.
Estamos assistindo os primeiros movimentos separatistas no Brasil, vindo do Sul. São oportunistas que tentam capitalizar o descontentamento público para objetivos particularistas. Todos nós, que precisamos dos serviços públicos nos sentimos expropriados pelos impostos. Pagamos impostos quase igual à Suécia e temos serviços de padrões de países falidos.
O povo brasileiro não percebe o retorno dos 2 trilhões que paga anualmente de impostos. A informática possui ferramentas capazes de acompanhar em tempo real o desempenho de cada posto de saúde, de cada escola, de cada secretaria de governo. E porque não avançamos em tecnologias para melhorar a gestão, seja ela de : pessoal, de finanças, de materiais, etc?
Este fenômeno se replica em 99,99% dos municípios brasileiros. O governo central repassa recursos para que as crianças recebam merenda escolar de primeira qualidade, mas nossas crianças continuam a merendar suco tang com bolacha cream cracker. Nas aulas da EJA, as aulas duram 35 minutos e grande parte dos professores chegam com 10 minutos de atraso e, ainda vão tomar cafezinho, resultado, os alunos têm em média, 20 minutos de aula. Enquanto isso, o diretor(a) finge que nada vê.
Na delegacia de polícia esperamos bastante quando vamos fazer Boletim de Ocorrência, geralmente, somente existe um escrivão para cada uma fila grande. Somente 30% de quem procura um posto de saúde pela primeira vez consegue ficha, isto se dormir na fila. Os consumidores de luz não conseguem fiscalizar seu consumo de luz perante a CELPA.
Não percebo a organização de um sistema municipal de segurança preventiva e coercitiva envolvendo, Polícia militar, Polícia Civil, Guarda Municipal e secretarias municipais destinadas a colaborarem com as ações da secretaria estadual de segurança. Saneamento, nem falemos....os asfaltos e aterros acontecem fundamentalmente às vésperas de eleições. Mobilidade urbana inexiste na região metropolitana, nossos governantes, há 30 anos deixaram de antever estes inchaços das cidades polos e da região da grande Belém.
Enfim, a agenda da sociedade é a reestruturação radical da gestão municipal. Os entes que devem criar incentivos para esta política pública são os governos federal e estaduais. O governo central é o agente maior para propor este tipo de política, tanto aos governos estaduais como aos governos municipais. Todos sabem como induzir a adesão à programas considerados prioritários. A conclusão é clara, os governos ainda não perceberam que o funcionamento dos serviços públicos de qualidade é o que o povo mais quer e sempre quiz. Aí vem a teoria da conspiração em minha cabeça? Melhorar a gestão municipal seria fechar o ralo da corrupção....será que não existe ninguém interessado em acabar com esta chaga social?
Os políticos e a sociedade civil organizada estão cegos pela política stricto senso. Ninguém está percebendo o desespero da população em todas as cidades deste País. Será que viveremos um”estouro da boiada” pelos direitos aos serviços públicos para que a classe política, a mídia e a sociedade civil venham a perceber que a sociedade está abandonada? Enfim, o povo quer direitos de cidadania básicos.
Tenho dito.