Acompanhei nas últimas semanas a enorme campanha da militância virtual do PT,  no sentido de demonizar a figura do presidente do supremo Joaquim Barbosa, após a condenação, por peculato,   os dirigentes  petista de 2005: O  presidente (Dirceu), o vice ( Genoíno) e o tesoureiro (Delúbio).

O comando do  PT e toda influência midiática do governo operam uma  estratégia no sentido de ver,  o chamado “mensalão  e o trensalão” tucano, ser julgado pelo STF.  Esta estratégia visa acertar dois coelhos com a mesma cajadada: 1- demonstrar que o mesmo “desvio” cometido pelo PT  é compartilhado pelos tucanos e por todos os partidos brasileiros, que seria o caixa dois. E, 2- reequilibrar o jogo de forças para o confronto argumentativo na sucessão presidencial em curso. O  STF  transformou o crime de caixa dois em peculato, os petistas querem o mesmo tratamento para os tucanos.

Os advogados dos petistas perderam a batalha no supremo em torno da qualificação do delito: queriam a caracterização de caixa dois, mas o supremo, por maioria, optou pela adjetivação de peculato. Existe uma grande diferença, em termos de condenação moral e penal entre estes dois delitos. Caixa dois é um desvio ético, corrupção é um crime horrendo perante a sociedade e o código penal.

Caso a VISANET seja uma empresa privada e que opere com lucros obtidos no mercado, então os recursos do mensalão petista não teriam origem nos cofres públicos. Porém o supremo firmou a convicção de que os recursos da VISANET são públicos e enquadrou os dirigentes petistas como autores de peculato. Peculato é a denominação de corrupção no serviço público.

Todo o debate subsequente advém deste primeiro entendimento da maioria dos ministros do supremo. E afinal, a VISA  e seus recursos são públicos ou não? Será que os ministros têm formação  na área financeira para iniciar e terminar um parecer com este conteúdo?  Qual a autoridade financeira que ofereceu um parecer orientador ao supremo? Existe consenso  entre os especialistas na área contábil e financeira sobre a origem dos recursos do mensalão, se público ou privado? Se não existe, o supremo não poderia firmar convicção, porque juízes ou ministros não são especialistas nesta temática

A qualidade dos debates devem incidir primariamente sobre esta questão. A sociedade brasileira tem sede de ver a justiça funcionando e os corruptos sendo condenados. Será que a maioria do supremo não ficou a reboque da opinião de maioria forjada a partir  dos meios de comunicação de massas em nosso País? Será que os ministros não jogaram para a torcida?

Caso o entendimento seja de que os recursos usados no mensalão petista sejam de origem pública, então a maioria do supremo tomou decisão contra poderosos,  e neste sentido, fez história republicana no Brasil. Mas, se a maioria do supremo tomou decisão com base na pressão da opinião pública, então, foi cometido uma enorme injustiça em nosso País. E, estes ministros entrarão para a história como populistas, que destruíram reputações em nome de agradar a opinião de maioria, forjada artificialmente a partir de uma mídia, majoritariamente, irresponsável.

A oposição ao governo federal faz uma violenta campanha contra a nova maioria no supremo que reconheceu que não houve formação de quadrilha no mensalão petista. Não há dúvida, este debate está politizado e contaminado pela sucessão presidencial deste ano.

Lógico, se não houve peculato, como poderia haver formação de quadrilha? Parece que a maioria do supremo começa a esboçar um entendimento diferente daquele ocorrido quando da condenação dos três dirigentes petistas. Esta segunda decisão coloca em xeque o conteúdo da primeira decisão tomada pela maioria do supremo.

Outra certeza que temos, é que foi um ministro, nomeado pelo presidente Lula, o Joaquim Barbosa,  quem liderou dentro do supremo, os argumentos da “ teoria do domínio dos fatos”  para caracterizar o mensalão como peculato. Ou seja, não foi uma ação  oposicionista  de ministros do STF nomeados por FHC.

Caso esta assertiva seja  verdadeira, também não podemos chamar os seis ministros que negaram provimento à formação de quadrilha, como uma ação concertada com o governo. A não ser que venhamos a achar que Barbosa foi nomeado por Lula, mas já rezaria na cartilha tucana. Seria muita “paranóia”.

A minha convicção é de que houve crime eleitoral. Este crime se caracterizou pelo repasse de recurso da VISA, portanto, recursos privados, ou seja, um crime de caixa dois, que foi repassado à cúpula dos partidos aliados. Portanto, não houve mensalão, caracterizado como um pagamento  mensal dirigido a parlamentares individuais.

 Parece que o que houve foram ações de caixa dois como mecanismo de patronagem para que os partidos, da base aliada  dentro do congresso nacional, viessem a aprovar emendas constitucionais, como a reforma da previdência. Assim como, de forma  já confessada, estes recursos foram usadas para financiar a campanha de 2006, dentre  candidatos majoritários e proporcionais  apoiados pelo governo federal nos estados.

Claro, O PT e os demais partidos da base aliada beneficiados pelo esquema, assim como os petistas que foram denunciados pelo presidente do PTB, o deputado Roberto Jefferson, deveria m ser penalizados, a partir da lei do caixa dois e virem a sofrer todas as consequências cabíveis. Se fosse na Alemanha seriam banidos da vida pública. Não acredito na história de “caronchinha” de que deputados da base aliada, cerca de 400, tenham recebido mensalmente uma mesada para votarem com o governo.

Por que o supremo não penalizou os partidos, como agentes coletivos deste tipo de ação? se este crime eleitoral foi plenamente confessada, de forma multipartidária pelo réus do chamado mensalão? O supremo preferiu não se indispor com vários partidos , e, ao mesmo tempo, desferiu um “corte político cirúrgico”,   condenado, por peculato, os dirigentes petistas. Com esta decisão, o STF conseguiu  evitar a formação  uma ampla frente de contestação à sua ação. Sem dúvida, o Supremo dividiu os partidos para não sofrer grandes contestações institucionais.

Não creio que o PSDB, DEM, PPS e os demais partidos da oposição devessem fazer coro, politizando esta decisão, no mínimo polêmica,  tomada pelo supremo, afinal, “pernamanca que bate em xico surra francisco”. E, os tucanos poderão  sofrer a mesma dose de injustiça que os petistas podem  estar submetidos.

Caso o supremo tenha uma posição diferenciada em relação ao “mensalão  tucano”, então o STF estará materializando facciosismo, o que seria catastrófico para a crença na principal instituição jurídica de nosso país.

Joaquim Barbosa está enfrentando um ataque vigoroso da militância virtual petista. Creio que sua aplicação da  “teoria do domínio dos fatos” pode ter sido afoita e perigosa para o princípio da presunção de inocência. Barbosa e a maioria do STF  materializaram o princípio de que o  acusado é culpado até que prove o contrário. E isto é muito perigoso para tudo e para todos.

Os petistas têm o direito de denunciar qualquer tipo de facciosismo da maioria do supremo. Mas este partido deve ser mais humilde, fazer autocrítica por ter traído seu discurso ético, construído nos último 30 anos. Fazer caixa dois, usar o poder de governo e o poder econômico para desequilibrar uma disputa eleitoral é condenável sob o ponto de vista moral, político e penal. O PT jamais pensou em punir seus dirigentes. Não, caixa dois é um crime eleitoral que deveria ser considerado gravíssimo e que deveria envergonhar qualquer partido, que se reivindica democrático e republicano.

Quanto ao ministro Joaquim Barbosa, ao firmar posição dogmática sobre a ideia de peculato e lutar com todas as forças para ver suas convicções assumidas pela maioria do supremo, corre sério risco de cometer uma injustiça histórica. Um presidente da corte suprema, deveria ser o mais comedido, um mediador de conflito intrainstitucional e optar por aquela decisão que consagre o princípio de que é preferível absolver um culpado do que condenar um inocente.

Tenho dito.

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